27 de novembro de 2008

Consciência Negra

Antonio Sebastião de Lima
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Sobre o dia da consciência negra, a matriarca da escola de samba Império Serrano, do Rio de Janeiro, deu a sua opinião franca e direta: uma bobagem, pois ninguém fala em dia da consciência branca. Nada como a simplicidade pela voz da experiência. Assim como a magia, a consciência não tem cor. Na cultura ocidental, entretanto, o mal veste negro. A escuridão, as trevas, a ignorância, a ausência de luz, vinculam-se à cor negra que desperta medo, pavor, rejeição. Trabalhar para o mal com as forças espirituais é magia negra. Aquele que nutre propósitos, sentimentos e pensamentos perversos tem a consciência negra. O período de angústia e sofrimento que precede a iluminação espiritual é denominado noite negra da alma. Os episódios deploráveis da vida de um povo, em determinada época, são referidos como páginas negras da história. As passagens difíceis, cheias de obstáculos e sofrimentos na vida de uma pessoa são tratadas como tempos negros. A vida do indivíduo, pecaminosa, criminosa, cheia de maldades é resumida como passado negro. Daí para o preconceito contra o negro é um passo, principalmente em países de passado escravocrata.
A atual onda de afirmação dos negros brasileiros nada tem de positiva e original. Cuida-se de mimetismo, característica que levou os argentinos a nos apelidarem de “macaquitos”. Imitar povos desenvolvidos economicamente é procedimento comum a povos subdesenvolvidos, porém, no Brasil essa característica é mais acentuada e sem critério. A nação brasileira resultou da colonização européia de matiz latino, por gente sem intenção de fincar raízes na América. A predominância social, política e econômica dessa gente de pele alva foi decorrência da conquista do território. A nação estadunidense resultou da colonização inglesa, de gente que veio para ficar e construir um novo mundo na América. O movimento de afirmação da raça negra resultou das características culturais dos EUA.
No Brasil, o ambiente era outro. Após a abolição, o negro tornou-se cidadão com plenos direitos, sem segregação. “Paulatinamente, a mão-de-obra escrava foi substituída pela assalariada até a abolição da escravatura, quando o negro deixa de ser coisa e adquire o status de pessoa (1888). Sujeito de direitos, mas pobre e analfabeto, o negro, livre, só conseguiu cidadania ativa após aprender a ler e escrever e esperar pelo voto universal. A sua ascensão social (até os dias atuais, inclusive) foi lenta e sofrida, em virtude da situação de extrema inferioridade da qual partiu, do preconceito, da preferência pelo imigrante europeu e do caráter aristocrático da sociedade brasileira” (Revista Emerj, vol. 10, nº 39, 2007, pág. 160). No Brasil, a favelização do negro decorreu da sua pobreza e não da sua cor. Embora sem amparo no direito, há preconceito como em qualquer outro país do mundo, em relação ao negro, ao judeu, ao palestino, ao imigrante, ao deficiente físico ou mental, ao morador de rua, tanto em nível social como em nível individual. As cotas em universidades resultam de um mimetismo anacrônico e servem para criar a segregação, alimentar o preconceito e estimular hostilidades.
MIMETISMO – O mimetismo ocorre em qualquer área. Para imitar os EUA ou a Inglaterra, na atual crise financeira, o governo brasileiro pode entregar dinheiro de modo precipitado e a quem não necessita. Luiz Inácio, em seu primeiro pronunciamento sobre a crise, errou na letra e acertou na melodia. A marola indica diferença entre o que ocorreu no hemisfério norte e o que ocorre no Brasil. Enquanto lá foi necessária cirurgia, aqui a vacina pode bastar, inclusive contra corrupção e estelionato. Salvo engano, na Europa a esperteza levou restaurante a cobrar dos clientes alguns euros a mais pelo uso de pratos e talheres. No Brasil, os bancos cobram dos clientes tarifas pelos serviços bancários, como se tais serviços não fossem inerentes à atividade bancária. Para legitimar o ilícito enriquecimento, os bancos invocam resoluções do Banco Central, como se essa instituição tivesse força normativa igual ou superior à do Congresso Nacional. Inventaram a “renovação do cadastro”, pela qual o cliente tem de pagar semestralidades. Isto não é serviço que interessa ao cliente, cujo cadastro está pronto desde a abertura da conta. Os bancos organizam seus serviços para receber depósitos, operar e lucrar com o dinheiro do correntista. Qualquer tarifa, nesse contexto, é ilegal e imoral. Se o cliente tomar dinheiro emprestado, a remuneração é o juro. O que não pode é o banco apropriar-se de parte do salário do correntista, depositado pela fonte pagadora, impondo unilateralmente contínuas reduções mediante lançamentos na conta corrente. Nos termos da Constituição de 1988, salários são irredutíveis.
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O autor é professor e juiz de direito aposentado, de Penedo

23 de novembro de 2008

Juiz Insolente

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Foi dito alhures que os votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) são lições de direito. Se assim for, a universidade lhes é mais adequada do que o tribunal. O escopo da judicatura é decidir com justiça (o que já traz em si grande lição). A linguagem da decisão há de ser límpida, que um intelecto menos cultivado seja capaz de compreender. Votos cuja leitura exige mais de 15 minutos entram na categoria dos prolixos, confusos, rebarbativos e anacrônicos. Para concordar com o relator, um minuto basta. Para discordar, mais alguns minutos. Concisão e objetividade, sem abdicar da elegância, clareza, serenidade e imparcialidade, são de muita valia à prestação da tutela jurisdicional. Os magistrados não devem perder as estribeiras. Antes da TV Justiça não se via um juiz chamar o outro para briga corporal, nem bravatas, nem sorrisos e expressões artificiais, nem fala mascada ou declamações. A emissora de TV exibiu a vaidade e a veia artística dos juízes.
Foto: Wilson Dias/ABr
Plenário do Supremo Tribunal Federal, em Brasília
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Escandalizada com a decisão monocrática do habeas corpus (hc) impetrado por Daniel Dantas, a nação surpreendeu-se com manobra forense. As instâncias intermediárias foram ignoradas. Ao invés de lhes remeter os autos do processo, o STF admitiu e julgou o hc, sob o argumento de que estava “temperando” o disposto na súmula 691 assim redigida: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”. Inconstitucional, apesar dos precedentes, o “tempero” tem sabor político e digitais plutocráticas. Não havia justo motivo para desrespeitar a jurisdição intermediária. Quiçá para atenuar o erro do seu presidente, o STF foi mais longe: trouxe para o tribunal pleno o que devia se esgotar na turma. O hc perdera o objeto. O paciente fora colocado em liberdade. A ordem de soltura fora cumprida, tanto para a prisão provisória como para a prisão preventiva. Restava arquivar os autos do processo. O motivo para insistir no julgamento em plenário ficou evidente: melhorar a imagem dos ministros lançando um libelo contra o juiz em sessão transmitida pela TV Justiça.
A independência dos juízes parece incomodar os ministros do STF. Juiz e tribunal podem discordar sobre a necessidade da prisão. Isto é normal. Inadmissível, entretanto, por falta de amparo no direito positivo, a tese de que a prisão preventiva não pode ser decretada com base nos mesmos fatos que autorizam a prisão provisória. “Decorrido o prazo de 5 (cinco) dias de detenção, o preso deverá ser posto imediatamente em liberdade, salvo se já tiver sido decretada sua prisão preventiva” (lei 7.960/89, 2º, §7º), ou seja, estribado no mesmo inquérito policial, o juiz pode decretar a prisão preventiva ainda com a prisão provisória em vigor. À luz do Código de Processo Penal – não mais à luz da lei especial – o juiz apreciará os fatos narrados no inquérito, com ou sem novidade. Ademais, nova prova é fato novo em relação ao estado do inquérito. Ainda que se refira aos fatos antigos, o ato posterior de prová-los é um fato novo gerado pela inteligência e pela ação humana.
Enquanto a prisão provisória depende do pedido do delegado ou do promotor, a prisão preventiva pode ser decretada de ofício pelo juiz (hipótese que não ocorreu no caso Dantas). Em instante de raquitismo jurídico, sob febre emocional na sessão de julgamento, foi dito que o juiz se torna parte processual ou cúmplice quando defere pedido do promotor ou do delegado. Examinar, deferir ou indeferir o pedido é tarefa do juiz. Por haver bem cumprido esse dever tentam crucificá-lo servindo-se do sofisma ad hominem (desvio do foco). Acusam o juiz de sonegar informações, de insolência, de afrontar o tribunal de modo oblíquo. O ministro Marco Aurélio colocou o cataplasma adequado no bilioso argumento. Leu as informações e mostrou que foram prestadas de modo amplo, claro e respeitoso. O juiz citara, inclusive, lição da lavra do presidente do STF. Os ministros enxergaram o insólito e o grosseiro onde só havia o normal e o educado. A irritação dos ministros decorre, talvez, do apoio que o juiz federal recebeu da magistratura e da opinião pública. O povo se manifestou pela rede de computadores, jornais e revistas. Os ministros sentiram-se desprestigiados. O esforço cerebrino dos ministros para retirar a autoridade moral e jurídica do juiz não repercutiu bem na opinião pública. A campanha contra o juiz em jornal de grande circulação, certamente financiada pelo interessado, também não surtiu efeito. Melhor ficaria a imagem do tribunal se a censura recaísse sobre o seu presidente e sobre o indiciado (contra o qual há notícia de indícios e provas da autoria e materialidade de graves delitos).
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O autor é professor e juiz de direito aposentado, morador de Penedo

10 de novembro de 2008

Advogados versus Juízes

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A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pediu ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instauração de processo disciplinar contra magistrado do Estado de São Paulo. Segundo informe da Associação Nacional de Magistrados Estaduais (Anamages), o motivo do pedido foi a opinião do magistrado de que somente em casos excepcionais, graves e urgentes, os advogados deviam ser recebidos nos gabinetes dos juízes, pois sem a presença do advogado da parte contrária, há quebra do princípio da igualdade processual. A OAB invoca o direito do advogado de se dirigir aos juízes nos gabinetes, independente de horário previamente marcado ou outra condição, observada a ordem de chegada (lei 8.906/94, 7º, VIII). O magistrado entende que: (i) está no legítimo exercício da liberdade de expressão (CF 5º, IV) (ii) o citado dispositivo do Estatuto da Advocacia é inconstitucional.
Nota-se, de início, que um juiz estadual está sendo processado disciplinarmente perante um órgão federal. Deve-se tal anomalia à inconstitucional emenda à Constituição nº 45. A Assembléia Constituinte, acertadamente, havia rejeitado a adoção do CNJ, por ser incompatível com a forma federativa de Estado. No Estado federal não há magistratura “nacional”, salvo: (i) na federação de fachada, como no Brasil de 1937/1945 e 1964/1985 (ii) na ficção de Kelsen. No autêntico Estado federal há magistratura federal e magistratura estadual, cada qual independente na sua esfera de competência. Daí a Constituição se referir aos órgãos do Poder Judiciário e não aos órgãos do Poder Judiciário “federal” ou “nacional” (art. 92). Em razão da autonomia constitucional do Estado federado, cabe ao Poder Judiciário estadual resolver os seus assuntos internos, inclusive os de caráter disciplinar. O Poder Legislativo brasileiro, em frontal violação ao princípio da separação dos Poderes, colocou-se contra a decisão da Assembléia Constituinte e criou o CNJ pela EC 45. No que tange à manifestação do pensamento, o magistrado, ainda no serviço ativo, pode publicar artigos de sua lavra. A liberdade de expressão é a regra. A lei orgânica só proíbe o magistrado de: (i) opinar sobre processo pendente de julgamento (ii) emitir juízo depreciativo sobre decisões de órgãos judiciais. A citada lei ressalva a crítica nos autos do processo, em obras técnicas ou no magistério.
Nos anos 80, na capital do Rio de Janeiro, ao assumir a 3ª. Vara de Família, o juiz se deparou com situação caótica. Pilhas de autos de processo no gabinete. Despachava-os em pé. As pilhas se renovavam. A cada momento o trabalho era interrompido por advogados com assuntos ordinários. O juiz, então, baixou portaria fixando horário para receber os advogados. Dividiu as bancas: 4 para os processos pares e 4 para os processos ímpares. Segunda e quarta-feira despachava os processos pares; terça e quinta, os processos ímpares. Instruiu os escreventes sobre o modo como deviam organizar os processos para despacho (assinaturas, petições iniciais, impulso processual, decisões interlocutórias, sentenças). Na sexta-feira despachava o saldo dos processos da semana que exigiam exame mais demorado. As audiências dos processos contenciosos eram realizadas de segunda a quinta-feira, de 30 em 30 minutos e as dos processos consensuais na sexta-feira, de 10 em 10 minutos. Processos não sentenciados em audiência o eram em casa, inclusive nos fins de semana. Dois promotores de justiça, lúcidos e competentes, sem prejuízo algum da sua autonomia funcional e independência intelectual, foram de inestimável ajuda. Ocupavam sala pequena. Tão logo aliviada a carga de processos, o juiz propôs a troca, cedendo-lhes a sala maior e mais confortável. Os serventuários assimilaram bem a filosofia de trabalho do magistrado. Em menos de um ano o caos se dissipara. A nota destoante foi dada pela OAB. Colocando as prerrogativas da classe acima do interesse público, representou contra o juiz. No Tribunal de Justiça, a OAB sucumbiu. A necessidade é a suprema lei. O interesse da sociedade se sobrepõe ao interesse da classe. A prerrogativa veiculada em lei federal interfere no funcionamento do Judiciário, o que significa interferir na autonomia do Poder, e isto só é possível a uma assembléia constituinte. A OAB recorreu ao Superior Tribunal de Justiça. Obteve êxito. Felizmente, o serviço já estava em dia. O juiz não se convenceu do acerto da decisão do STJ, como se vê desse trecho do artigo publicado na Revista Emerj, vol. 10, nº 37, 2007, pág. 85: “A lealdade deve orientar a conduta do advogado. Impõe-se a esquiva ao tráfico de influência e aos expedientes procrastinatórios. As visitas aos gabinetes dos juízes para embargos auriculares representam deslealdade para com a outra parte; há quebra do princípio da igualdade processual. O advogado deve usar a tribuna para apresentar suas razões com a publicidade que o processo requer, de maneira que a parte contrária possa replicar”.
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Itatiaia, Obama e o choque de consciência...

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Num país onde o voto é facultativo, a vitória de Barack Hussein Obama traz uma lição muito maior do que a vitória da esperança, da vontade de mudanças... Foi uma vitória que se deu a partir da motivação popular em sair de casa para referendar o desejo de uma mudança radical de atitudes administrativas e políticas. A população nos EUA está alarmada com o desmando e o comportamento sempre conservador das elites políticas que vêm governando aquele país continental. A de Itatiaia também está...
Não se pode fechar os olhos para o fato de que tudo o que acontece por lá reflete aqui no Brasil. Por várias razões: desde o fato de que somos macaquitos e imitamos, infelizmente, o pior do que eles vivem, até o fato de que sempre dependemos economicamente do Tio Sam e, por décadas batemos cabeça e continência em obediência aos seus objetivos e opiniões. É um povo patriota ao extremo, hedonista, preconceituoso e que visa apenas o seu próprio bem estar... mesmo que à custa do sofrimento dos povos sulamericanos, seus vizinhos, e de outros que possam se tornar "parceiros" de seus interesses.
A expectativa e esperança é de que Obama tenha uma sensibilidade maior. Uma visão mais holística de mundo... E entenda o desastre que um povo belicista como o americano precisa ver o mundo e o reflexo de seus interesses de uma forma mais crítica e busque amenizar as ações... ou pelo menos não tanto agressiva e dominadora.
O grande mérito americano é lavar sua roupa suja para o mundo inteiro ver. A liberdade de imprensa já derrubou até presidente. Esse é um exemplo que devemos seguir. E ninguém tentou destruir a carreira dos jornalistas por dizerem a verdade. De repente me vem a imagem de candidatos, em Itatiaia, tentarem frear a verdade através de processos...
Pobre Itatiaia. Luiz Carlos vai perder os poucos cabelos que tem. Onde já se viu ser o preferido! Ser escolhido "apenas" porque era a imagem da mudança possível! Deve sofrer todo o tipo de acusações pelo crime que cometeu (sim, porque aqui no Brasil é crime...) que foi o de ser eleito pelas mesmas razões que o povo, que começa a acordar de um sono que parecia interminável, elegeu os novos governos pelo mundo afora: descrença nos candidatos padrão, enojados com as promessas de CCs e maracutaias, ausência de conversas entocadas em mafuás e casas de negociatas... Tudo claro, tudo aberto. Nada de ofensa, insinuações, retaliações...
Acredito num choque de consciências, uma vontade verdadeira de acreditar, mesmo que no desconhecido, mas pela presunção de que ainda assim, arriscando, será melhor do que o que vem acontecendo nos últimos mandatos. Afinal, inferir pelo que se vê e pelos indicadores que se apresentam é bastante válido também. Comparação é uma boa forma de avaliar atitudes e compromissos.
O prefeito eleito tem tudo para embarcar nessa onda. Se tomar a educação como meta principal, vai fazer história em Itatiaia. E tem tempo para isso porque com um bom governo, se reelege e faz o sucessor... e, com 12 anos de bons serviços (... valha-me Senhor dos Passos!) nossa cidade pode retomar os trilhos para um futuro verdadeiramente promissor.
Itaiaia merece!
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3 de novembro de 2008

Personalismo perdulário

Humberto Innecco
professor e jornalista
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Itatiaia precisa de cuidados. Precisa ser acarinhada para que a população tenha a oportunidade de ter orgulho da cidade onde vive. Esses quase vinte anos de emancipação não foram suficientes para que o cidadão comum deixasse de se sentir, como e apenas, um morador de um “lugar” perto de Resende. Afinal, além de ter suas fronteiras físicas delimitadas, qual foi a grande atitude tomada em relação ao amor próprio da população no sentido de torná-la itatiaiense, orgulhosa de sua cidade? O que mudou foi o lugar onde pagar impostos, o lugar onde reclamar dos transportes, o lugar onde assistir às circenses reuniões da Câmara Municipal, o lugar onde governam os prefeitos... Mas o senso comum, as necessidades mais imediatas, as compras de bens e serviços estão voltadas para a cidade vizinha.
Há uma razão primordial para isso. Não existe um programa de desenvolvimento, discutido amplamente com a população, para os próximos 10, 20 ou 30 anos. E a cidade precisa disso porque ainda não tem nada estruturado de maneira sólida e competente que não seja sua fome de arrecadação.
A cidade nunca acompanhou o desenvolvimento de programas e projetos importantes que atravessassem gestões seguidas, mesmo que de diferentes grupos partidários. Projetos que fossem continuados e honrados por fazerem parte de um desejo comum do povo, dos legisladores e do executivo. Projetos pensados a longo prazo, com responsabilidade e visão de futuro. Mas, quem desenvolveria esses projetos e programas de trabalho? Não seria difícil encontrar. Muitas cidades o fizeram. Escolheram pessoas competentes e audaciosas que pudessem pensar a cidade como um todo. Não se deixaram dominar e serem planejadas por senhores feudais que usam o poder apenas para expandir seus domínios ou modernizá-los a custa do esforço e dos recursos do povo que deveriam ser voltados também para o resto das pessoas.
Escolher personalistas parece um erro recorrente das cidades brasileiras. Fazem o que “eles entendem” como certo. Sem nenhuma ética ou direito destroem e reconstroem o que foi feito por seu antecessor com a avidez dos perdulários que desancam o patrimônio e o erário públicos como um “novo rico”, um herdeiro sem berço, que detona, sem compromisso, um dinheiro que não fez nada para conquistar... São personalistas e perdulários. Querem entrar para a história. Querem sucesso antes mesmo do trabalho... Ignoram que, como dizia Einstein, “o único lugar onde o sucesso aparece antes do trabalho é no dicionário”... E, se for preciso, mentem. Corrompem. Fraudam. Tudo pela promoção pessoal. À revelia do que prometeram ao povo para serem eleitos.
Quando em Berlim, você embarca numa bela estação de trens que está da mesma forma há décadas, vê que foi ali, nos anos quarenta, na mesma estação, que embarcaram as tropas na segunda guerra. Intacta. Cuidada e mantida não apenas pelo seu valor histórico, mas pelo seu valor social, econômico... Foi uma obra erguida com finalidades maiores que as eleitoreiras ou de fachada. Faz parte ainda do grande complexo de transportes alemão. Teve planejamento, visão de futuro, plano diretor sério e rigorosamente cumprido (porque foi rigorosamente estudado). Obedeceu às necessidades reais de desenvolvimento. Não foi um “acerto” para beneficiar um vereador que tem uns caminhões ou umas máquinas ou uns ônibus escolares... Foi uma obra baseada em planejamento coerente e não em prostituição eleitoral.
Itatiaia vai padecer por muitos anos até que se estabeleça um programa íntegro de continuidade para o seu desenvolvimento. É difícil romper com esse estado de favorecimentos públicos ilegais, referendados por mandatos voltados para a locupletação pessoal.
Cada novo administrador que entra perde um tempo enorme e precioso para desmontar (se é que quer desmontar) os antigos processos e esquemas... e acaba se perdendo em seus objetivos iniciais. Além de ter que compor o novo quadro de forças ainda tem que movimentar, com muito cuidado, cada peça da administração para não emperrar a máquina em função de boicotes e sabotagens... Uffa!!
Nesse cenário, se montam os novos governos. Obrigados a governar com “um olho na missa e outro no padre” durante uns dez a quinze meses.
Do outro lado, a população. Sem nenhum poder de reação social (não teve formação para isso nos últimos 50 anos) observa, de forma contemplativa, as intervenções pontuais, na maioria demagógicas e eleitoreiras, que a administração vai executando. Um prédio escolar novo (sem educação e educadores verdadeiros dentro), um posto de saúde novo (sem medicamentos e equipe capaz), um muro aqui, uma grade ali, um chafariz (oooooh!), um campinho de futebol... uma festa junina... um forró...
Pobre Sucupira, quer dizer, Itatiaia... quanto tempo vamos viver essa bandalha? Levaremos muito tempo ainda para que nossos gestores tenham cultura e capacidade administrativa... além de apenas votos?
Será que teremos a sorte e o privilégio de eleger um “louco” que invista em educação de forma tão coerente, audaciosa e responsável que, rompendo com os currículos ultrapassados e distantes da nossa realidade, mostre ao Brasil que uma cidade pode renascer das cinzas a partir da coragem e da firmeza de objetivos? E assim construa um ambiente de cidadãos forjados por escolas que não se limitaram a ensinar a ler e escrever ou a fazer continhas de matemática... Mas escolas que ensinaram a reagir socialmente formando cidadão de primeira linha ao invés de pessoas com identidade e CPF, manipuláveis através de um título de eleitor...

1 de novembro de 2008

O papel de coitadinho não cabe a uma pessoa como o ex-prefeito Almir Dumay

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Após essa decepcionante decisão do Tribunal Superior Eleitoral, me pergunto até onde vai o cinismo e a falta de seriedade das pessoas...
Vi muitas vezes pessoas que transgridem serem perseguidas. Vi contraventores sendo atacados pela federal. Vi gente de bem ser iludida por estelionatários e requisitarem ajuda policial. Mas nunca vi banqueiro de bicho chamar a polícia. Seja porque razão for. É um estado de contravenção sem direito a salvaguardas.
A situação almejada pelos advogados do Sr. Almir Dumay é, antes de tudo, falaciosa. Já houve uma eleição. E participaram dela, de forma normal, os candidatos normais. Quem, possivelmente, está se sentindo prejudicado tem as razões de seu problema nos atos que ele mesmo praticou... e foram as suas contas rejeitadas pela Câmara... e não as dos outros candidatos... A democracia que vivemos (nojenta e/ou injusta) é essa. E por sinal, diga-se de passagem, alimentadas por pessoas que se acham acima de tudo e de todos...
Francamente! O máximo que se deve fazer é uma consulta popular para saber se as pessoas aceitam ou não o resultado. Seria uma lição inesquecível...
O papel de coitadinho não cabe a uma pessoa como o Almir. Não se erra em política. Alugar a prefeitura para outrem é inadmissível e o povo não esquece as mazelas impostas por uma administração perdulária e nociva ao patrimônio público.
Coisas desse sistema representativo cada vez mais indecente e ineficiente. Nossas câmaras municipais, estaduais e federal cada dia mais lotada de meliantes e golpistas e a população sem poder de reagir... por falta de cultura e entendimento, o que tanto interessa a esses políticos que se perpetuam através de favores e cachacinhas... pobre população pobre... O velho Ulisses Guimarães tinha razão: "Não é feio perder uma eleição. Feio é não saber perder uma eleição".
Será que os bolsos de algumas pessoas estão tão vazios a ponto delas lutarem tanto para recuperar o poder com tanta perseverança? Não há uma forma mais digna de ganhar dinheiro? Um trabalho honesto... Ou será que lotear a prefeitura e ficar pescando com uma graninha por mês pode se chamar de trabalho honesto?
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